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Jogo do ultimato, emoção e razão

Suponha que você vai jogar um jogo com as seguintes regras:

Um cara dá R$ 10 para fulano.

Fulano pode escolher quanto dinheiro desses R$ 10 vai dar a você.
Você pode apenas aceitar ou rejeitar a oferta dele.

Se você aceitar, recebe o dinheiro que ele quis te dar.
Se você rejeitar, você e ele não ganham nada.

Fulano decide te dar R$ 1. Ele vai ficar com R$ 9.

O que você faz?

*

Seria racional aceitar R$ 1, certo? Afinal, R$ 1 é melhor do que R$ 0.

Mas, o que a maioria das pessoas faz? Elas rejeitam. Preferem não ganhar nada do que aceitar a proposta que consideram injusta. E, com isso, elas também fazem com que o fulano não ganhe nada.

Por que isso acontece?

Porque não somos seres apenas racionais. A emoção tem um peso enorme nas nossas decisões.

É comum sentir raiva quando se é tratado injustamente.

Através de exames de imagens cerebrais (fMRI) foi possível ver ativação da ínsula (região do cérebro que faz parte do “circuito da raiva”). Olha que curioso: essa ativação ocorreu em duas situações:

a) quando a pessoa recebeu uma oferta baixa ($1, em vez de $5)
b) quando a pessoa recebeu a oferta de uma pessoa (e não do computador)

Em outro experimento, o “fulano” ofereceu mais dinheiro quando a outra pessoa mostrava expressão facial indicando raiva do que quando a expressão era neutra (a raiva é um sinal de possível ataque / punição).

Nesse caso, a emoção é paradoxalmente racional. Expressar raiva faz a outra pessoa ser mais generosa. Ou seja:

a) ser puramente racional gerou $ 1
b) expressar emoção de raiva gerou $ 5

Uma emoção desagradável como a raiva sinaliza ameaça, o que faz a outra pessoa tender a te beneficiar (ou evitar te prejudicar). Mas, curiosamente, isso também pode acontecer do outro lado do espectro emocional.

Nossa simpatia também costuma provocar nas outras pessoas tendência a nos beneficiar (ou pelo menos evitar de nos prejudicar).

Usando a razão, você pode entender as emoções e suas consequências. Isso te torna mais capaz de se controlar, se relacionar melhor com as pessoas, tomar melhores decisões e conseguir melhores resultados em inúmeras situações.

Ps.: Esse jogo (Ultimatum game / Jogo do ultimato) é uma forma de aplicação da teoria dos jogos, assim como “O dilema do prisioneiro“.

*

Complemento:

Ao pensar friamente sobre o jogo, mais pessoas tendem a ser mais racionais e aceitar apenas R$ 1. Mas, em situações reais (ou mesmo experimentais), isso muda.

Um dos motivos é que decisão é diferente de escolha. Decisão é mental, escolha é comportamental. Podemos decidir aceitar R$ 1, mas na hora escolhemos recusar.

Outro motivo é que ao simplesmente pensar sobre o jogo, a pessoa pode não ser afetada por estímulos do contexto real.

Exemplo: João está prestes a aceitar a oferta de R$ 1 de fulano, mas vê no rosto e na linguagem corporal dele certas expressões emocionais. João imagina que fulano está pensando algo do tipo “Olha como é fácil tirar vantagem desse otário!”. Aí o jogo muda. João começa a sentir calor, o coração bate mais rápido, a cara fecha. Começa a pensar “quem esse babaca tá pensando que é? Vai ver quem é otário…” e recusa a oferta de R$ 1. Ninguém ganha dinheiro, mas João sente que ganhou o alívio de não se sentir sacaneado.

About the Author

Tiago Azevedo
Tiago Azevedo

Doutorando, mestre e graduado em Psicologia. Especializando em Neurociências. Vi na internet o melhor meio possível para conversar sobre a mente e o comportamento humano. Acredito que o conhecimento científico pode (e deve) ser compartilhado, e não ficar limitado a laboratórios de pesquisa e consultórios de psicoterapia. Há anos trabalho no "Universo da Psicologia", um projeto de divulgação da Psicologia em várias plataformas (blogs, Youtube, podcast, redes sociais etc) que soma mais de 200.000 seguidores.

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