A Psicologia científica é reducionista?
Ao falar sobre questões como a fisicalidade da mente, a “hipótese espantosa” de que pensamentos e sentimentos são atividade fisiológica do cérebro e o fato de que “a psicoterapia é um tratamento biológico, uma terapia cerebral”, é de se esperar a objeção de que isso é “reducionismo biológico” ou “reducionismo materialista”.
Sigamos com Steven Pinker em seu Tabula Rasa (negritos meus):
“A história e a cultura, portanto, podem ser alicerçadas na psicologia, e esta pode ser alicerçada na computação, na neurociência, na genética e na evolução“.
Essa é uma visão integrativa do conhecimento. A realidade é constituída de partes menores que formam partes maiores, níveis mais básicos (no sentido de dar base, fundamentos) onde se sustentam níveis superiores.
“Mas esse tipo de conversa dispara alarmes na mente de muitos que não são cientistas. Eles temem que a consiliência seja uma cortina de fumaça para a tomada hostil das humanidades, artes e ciências sociais pelos filisteus de avental branco. A riqueza de seus temas seria simplificada por um palavrório genérico sobre neurônios, genes e impulsos evolutivos. Esse cenário frequentemente é designado como “reducionismo”.
É um alarme que pode ser útil. Por outro lado, pode ser extremamente limitante.
“O reducionismo, como o colesterol, existe na forma boa e na ruim. O reducionismo ruim – também chamado “reducionismo voraz” ou “reducionismo destrutivo” – consiste em tentar explicar um fenômeno com base em seus elementos constituintes menores ou mais simples. (…) Conheço vários cientistas que acreditam (…) que faremos descobertas na educação, resolução de conflitos e outros temas sociais estudando a biofísica das membranas neurais ou a estrutura molecular da sinapse.”
Um dos motivos pelos quais é importante falar de psicologia concreta é evitar que se caia nesse reducionismo. Uma parte das pessoas, por ver uma psicologia abstrata, busca o que parece mais concreto. A neurociência é maravilhosa, mas tem seus limites (como todas as outras áreas do conhecimento).
“Mas o reducionismo voraz está longe de ser a opinião da maioria, e é fácil mostrar por que ele é errado. Como observou o filósofo Hilary Putnam, nem mesmo o simples fato de que um pino quadrado não se encaixa num buraco redondo pode ser explicado com base em moléculas e átomos, mas somente em níveis de análise mais elevados que envolvem rigidez (independentemente do que torna rígido o pino) e geometria.”
Isto é tão confuso quanto interessante. Lembra que “O todo é maior do que soma de suas partes“?
“E se alguém realmente achasse que a sociologia, a história ou a literatura poderia ser substituída pela biologia, por que parar por aí? A biologia poderia, por sua vez, ser resumida a química, e esta a física, e alguém teria de se virar para explicar as causas da Primeira Guerra Mundial com base em elétrons e quarks. Mesmo se a Primeira Guerra Mundial não consistisse em nada além de um número muito, muito grande de quarks e um padrão muito, muito complexo de movimento, nada se escalreceria descrevendo-a dessa maneira”.
Aqui as habilidades de raciocínio e escrita do Tio Pinker dão aquela sensação de “Nossa! É mesmo!”
O físico e filósofo Mario Bunge também fala dessa impossível ladeira da redução no Filosofia de la Psicologia. Se me lembro bem, ele responde dessa forma à pergunta sobre a possibilidade da psicologia ser reduzida à neurociência.
A Psicologia não pode ser reduzida, nem pode ser reducionista, nesse sentido do reducionismo voraz.
Venho falando muito sobre a psicologia concreta porque um dos motivos para a busca por redução é justamente a psicologia abstrata que parece falar de algo que não existe na realidade e, portanto, perde seu valor.
Por muito tempo lutei contra fenômenos psicológicos que me pareciam abstratos, como as emoções. “O que que é isso, exatamente? Onde que tá? Como que eu mexo com isso se eu não consigo pegar?”
Eu ouvia as pessoas falarem de emoções e pareciam que não falavam de nada, na realidade. Eram coisas etéreas, mágicas. Só entendi realmente as emoções quando descobri que são concretas, materiais, tão reais quanto os quarks.
Para isso, precisei da biologia. Não para reduzir a psicologia à biologia, mas para somá-las e ter muito mais entendimento do que teria só olhando para uma delas.
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2 Comments
[…] quando falei sobre reducionismo na psicologia científica? Pois […]
[…] Entendo o Tyson. Ele gosta de ciência e o reducionismo em ciência às vezes é bom. Mas outras vezes é ruim, ou…apenas impossível. Estamos falando de NÍVEIS diferentes do fenômeno. Já falei disso por aqui, no post em que explico porque a Psicologia científica não é e nem pode ser reducionista. […]